Fases e Comportamentos Antecedentes à Recaída na Dependência Química
A dependência química é uma condição complexa que afeta milhões de pessoas em todo o mundo. Refere-se à compulsão pelo uso contínuo de substâncias psicoativas, mesmo com consequências prejudiciais para a saúde física, mental e social do indivíduo.
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Tratar a dependência química é um desafio significativo. Muitas vezes, as pessoas enfrentam dificuldades para abandonar o uso de substâncias devido a diversos fatores, como a natureza viciante das drogas, as questões psicológicas subjacentes e as influências ambientais.
O tratamento da dependência química envolve uma abordagem holística, que pode incluir terapia individual, suporte familiar, medicamentos e mudanças no estilo de vida. No entanto, mesmo com todo o suporte disponível, muitos indivíduos encontram desafios significativos ao longo desse processo.
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Recaídas: Um Obstáculo Comum
Uma realidade enfrentada por muitos na jornada de recuperação é a ocorrência de recaídas. As recaídas são momentos em que uma pessoa volta a usar substâncias após um período de abstinência. Elas são comuns e não devem ser vistas como falhas no processo de tratamento.
Fases que Antecedem uma Recaída
Entender as fases e comportamentos que antecedem uma recaída é crucial para a prevenção. Identificar os sinais precoces pode permitir a intervenção e o suporte adequados. Algumas fases incluem:
- Negação: O indivíduo pode começar a minimizar a gravidade do problema e negar a necessidade de ajuda.
- Complacência: A sensação de controle sobre a dependência pode levar à complacência, diminuindo a vigilância em relação ao uso de substâncias.
- Isolamento: O isolamento social pode aumentar, afastando o indivíduo de fontes de apoio e aumentando a vulnerabilidade à recaída.
Estágios de Recaída na Dependência Química
Nessa jornada de recuperação da dependência química os desafios são significativos, e compreender os estágios de recaída é crucial para promover a prevenção e a intervenção eficazes. Os estágios principais incluem:
Lapso: O Primeiro Estágio
No processo de recuperação, um lapso refere-se a um pequeno deslize ou retorno temporário ao uso de substâncias. Pode ser caracterizado por um único episódio de consumo, muitas vezes seguido por sentimentos de culpa e frustração. É importante notar que um lapso não equivale necessariamente a uma recaída completa.
Recaída: O Segundo Estágio
A recaída ocorre quando há um retorno sustentado ao padrão anterior de uso de substâncias. Este estágio é mais grave do que um lapso e pode resultar em um ciclo de comportamento aditivo. Fatores como estresse, pressões sociais ou a falta de estratégias de enfrentamento eficazes podem contribuir para a transição do lapso para a recaída.
Colapso: O Terceiro Estágio
O estágio final, conhecido como colapso, representa uma deterioração significativa no controle sobre o uso de substâncias. Neste ponto, as consequências negativas tornam-se mais evidentes, afetando não apenas a saúde física e mental, mas também as relações pessoais e a vida profissional. O colapso muitas vezes exige uma intervenção mais intensiva e a reavaliação do plano de tratamento.
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Avisos que Antecedem a Recaída na Dependência Química
É crucial compreender que a recaída na dependência química raramente ocorre de forma súbita. Pelo contrário, é frequentemente precedida por uma série de sinais e avisos, muitos dos quais podem passar despercebidos. A recaída é, muitas vezes, o resultado de comportamentos e escolhas, por vezes inconscientes, que se acumulam ao longo do tempo, desencadeando um retorno ao uso de substâncias.
Comportamentos Inconscientes
Muitos dos avisos que antecedem uma recaída podem ser manifestações de comportamentos inconscientes. Esses comportamentos podem incluir a negligência das práticas de prevenção aprendidas durante o tratamento, a diminuição da participação em atividades de suporte e a tendência a minimizar a importância da abstinência.
A Cumulatividade dos Avisos
Os avisos muitas vezes se acumulam ao longo do tempo, formando um padrão que pode ser difícil de identificar no início. Isoladamente, cada aviso pode parecer insignificante, mas sua persistência e recorrência são indicadores essenciais do risco iminente de recaída.
Determinantes de Recaída por G. Alan Marlatt
G. Alan Marlatt , um destacado psicólogo e PhD, é reconhecido como uma figura fundamental nos estudos sobre adições e prevenção à recaída na dependência química. Sua extensa pesquisa e dedicação ao campo contribuíram significativamente para a compreensão dos desafios enfrentados por indivíduos em recuperação.
O livro de Marlatt, "Relapse Prevention: Maintenance Strategies in the Treatment of Addictive Behaviors", é amplamente considerado uma fonte essencial. Nele, Marlatt oferece insights valiosos sobre os fatores que desencadeiam a recaída, destacando a importância crucial de identificar e abordar sinais precoces para evitar a recorrência do comportamento aditivo.
Em seu livro, G. Alan Marlatt definiu determinantes de recaída como fatores específicos que aumentam a probabilidade de uma pessoa que está em recuperação da dependência química voltar a usar substâncias. Esses determinantes podem ser diversos e variam de pessoa para pessoa, mas Marlatt identificou alguns padrões comuns que podem desencadear a recaída.
Os determinantes de recaída podem ser agrupados em duas categorias, destacando fatores situacionais, emocionais e comportamentais que aumentam a vulnerabilidade de uma pessoa à recaída. As categorias são:
- Determinantes Imediatos:
Resultam do confronto entre uma pessoa ativamente investida em atingir e manter a abstinência e um cenário atual de risco.
- Antecedentes Cobertos:
Envolvem forças que atuam de forma não consciente, aumentando a vulnerabilidade e a probabilidade da pessoa recair. Estes são fatores subjacentes que podem influenciar o comportamento de maneira sutil.
Determinantes da Recaída
Determinantes Imediatos
- Situações de Risco Elevado: Certas situações representam uma ameaça para precipitar uma crise de recaída. Estas situações de risco elevado são desencadeadas a partir de estímulos intra-pessoais (ex. desejo e pensamentos) ou situações interpessoais (ex. pressão social direta e indireta, conflitos).
- Estratégias de Confronto (Coping): Uma das razões que levam ao risco de recaída é a procura de sedação ou estimulação face a estados emocionais ou pressões ambientais. O aspecto essencial nesse caso é o repertório de respostas disponíveis para lidar com essas situações. Tem sido sugerido que quanto maior for a diversidade das estratégias de confronto, menor a probabilidade da recaída.
- Expectativas de Gratificação: Os comportamentos impulsivos, comuns a vários quadros clínicos (toxicodependência, jogo patológico, abuso sexual ou perturbações da conduta alimentar), caracterizam-se por dois tipos de cognições – expectativa de gratificação imediata e adiamento das consequências negativas. Esta combinação que mantém a conduta de dependência é adicionalmente reforçada pelo desconforto que a privação do consumo provoca.
- Efeito de Violação da Abstinência (EVA): Marlatt introduziu a noção de EVA para descrever o conjunto de reações emocionais e atribuições cognitivas suscitadas pela quebra da abstinência. Genericamente, o EVA caracteriza-se por dois elementos cognitivo-emocionais: (1) dissonância cognitiva (conflito, pensamento dicotômico e catastrófico) e (2) atribuição pessoal (auto-desvalorização e culpabilização). Ao quebrar a abstinência, o indivíduo tende a levar em consideração fatores importantes como o esforço despendido, a intensidade do compromisso, a justificação encontrada para a recaída, a duração e importância em manter a abstinência ou a presença de pessoas significativas no momento da recaída. Portanto, não é uma necessidade que um lapso evolua naturalmente para um colapso. .
Antecedentes Encobertos
- Estilos de Vida: Muitos dos antecedentes encobertos de recaída incluem uma desproporção entre as obrigações diárias e as gratificações pessoais, razão pela qual o equilíbrio dos estilos de vida exerce um papel decisivo na Prevenção à Recaída (PR). O desequilíbrio, com um maior peso nas obrigações, está associado à percepção de privação, estados emocionais negativos, busca de gratificação, racionalizações permissivas ("depois deste esforço eu mereço uma bebida/cigarro/dose..."), e, consequentemente, a um maior risco de recaída.
- Decisões Aparentemente Irrelevantes (DAI): O conceito de DAI é utilizado para descrever uma sucessão de "mini-decisões" pessoais, de aparência inocente, mas que desperdiçam várias oportunidades para inverter o sentido das escolhas subsequentes de risco. Exemplos incluem frequentar lugares antigos de uso, estreitar laços de amizades com pessoas ativas, comportamentos impulsivos ou abandono das práticas de prevenção. Através deste processo, a pessoa encaminha-se para um "beco-sem-saída", no qual a escolha deixa de ser possível e a recaída é encarada como inevitável.
- Urgência e Desejo: Marlatt sugere que a urgência (dimensão compulsiva) e o desejo de consumir (dimensão obsessiva) são suscitados pela exposição direta ou indireta aos estímulos. Esta exposição é responsável pela ativação de processos atencionais e cognitivos, do desejo, das expectativas positivas e de respostas fisiológicas. Assim, a urgência e o desejo desencadeiam-se através de dois circuitos: (1) respostas condicionadas por gratificações passadas e (2) processos cognitivo-emocionais associados à antecipação da gratificação.
Conclusão
A jornada para atingir e manter a abstinência enfrenta uma série de desafios complexos. A dependência química é uma batalha constante, e a importância da prevenção à recaída e seus estágios não pode ser subestimada. Cada passo é crucial na construção de uma vida livre das amarras das substâncias.
A prevenção à recaída desempenha um papel vital na sustentação da sobriedade. Conhecer e compreender os estágios que antecedem uma recaída oferece ferramentas valiosas para resistir às tentações e superar os obstáculos. O autoconhecimento é uma peça-chave nessa jornada.
O autoconhecimento é fundamental na manutenção da sobriedade. Compreender as próprias motivações, gatilhos e padrões de comportamento é uma base sólida para tomar decisões informadas. Aliado ao entendimento dos determinantes de recaída, o autoconhecimento capacita os indivíduos a enfrentar desafios com resiliência.
Conselhos Adicionais para Manter a Sobriedade
- **Cultive Relações Saudáveis:** Construa uma rede de apoio positiva, envolvendo amigos e familiares que incentivem a sobriedade.
- **Busque Ajuda Profissional:** Terapeutas e conselheiros especializados podem fornecer orientação e suporte personalizado.
- **Participe de Grupos de Apoio:** Organizações como NA (Narcóticos Anônimos) e AA (Alcoólicos Anônimos) oferecem comunidade e compartilhamento de experiências.
- **Estabeleça Metas Realistas:** Defina objetivos alcançáveis, focando em pequenos passos diários para construir um futuro sólido.
- **Pratique a Autoaceitação:** Reconheça que a recuperação é um processo, e erros são oportunidades de aprendizado.
A jornada rumo à sobriedade é única para cada indivíduo, mas com determinação, compreensão e apoio adequado, é possível construir uma vida plena e livre das amarras da dependência química.
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